Gente, tudo o que eu for falar
sobre S. Bernardo, são impressões pessoais e alguns conhecimentos básicos
acerca da obra e do autor... Não tomem esses comentários como únicos e
incontestáveis, ok?
Primeiramente, tenho que falar
algumas poucas palavras sobre Graciliano Ramos: nascido na cidade de
Quebrangulo, no interior de Alagoas em 1892, tendo vivido os primeiros anos de
sua vida em várias cidades do Nordeste; a partir de 1915 viveu em Palmeiras dos
Índios, Alagoas novamente, cidade em que chegou inclusive a ser eleito
prefeito, no ano de 1927; esquerdista; preso político na ditadura de Getúlio
Vargas; com grande preocupação social (demonstrada em alguns de seus livros,
inclusive em S. Bernardo)
O protagonista de São Bernardo é
Paulo Honório. Retrato da pessoa infeliz, que buscou, sem sucesso, a felicidade
por meio da fortuna e posse. Homem que vivia para oprimir os mais fracos e
desprotegidos. Por fim, ele mesmo admite ter se tornado (ou ser) um bruto e
egoísta: “Madalena entrou aqui cheia de bons sentimentos e bons propósitos. Os
sentimentos e os propósitos esbarraram com a minha brutalidade e o meu egoísmo”
(p. 221). Paulo Honório é insensível, cuja “vida agreste” lhe deu uma “alma
agreste”: “O que estou é velho. Cinquenta anos pelo S. Pedro. Cinquenta anos
perdidos, cinquenta anos gastos sem objetivo, a maltratar-me e a maltratar os
outros. O resultado é que endureci, calejei, e não é um arranhão que penetra
esta casca espessa e vem ferir cá dentro a sensibilidade embotada” (p. 216).
Sua linguagem capitalista retrata o que ele é apenas, uma pessoa interessada em
posses, lucro, vantagens: “- Devia ter feito economia.
São todos assim,
imprevidentes. Uma doença qualquer, e é isto: adiantamentos, remédios. Vai-se o
lucro todo.” (p. 111).
A obra é classificada como
romance psicológico, voltado para o interior das personagens. Entretanto, não
se pode descartar o retrato da sociedade que é feito por Graciliano Ramos, ou
seja, a realidade externa também é explorada na obra. A sociedade rural é
mostrada com certo detalhe, a eterna discussão acerca da propriedade da terra,
e outros conflitos sociais e até políticos, também aparecem com frequencia em
S. Bernardo.
Favores Políticos: “Escola!
Que me importava que os outros soubessem ler ou fossem analfabetos?” (p. 50).
“De repente supus que a escola poderia trazer a benevolência do governador para
certos favores que eu tencionava solicitar” (p. 51);
Papel da imprensa: “- E
querendo defender-se, tem cá o Cruzeiro,
insinuou Azevedo Gondim. Pode escrever. Ou então escrevo eu, ou escreve o
Nogueira. Infelizmente o Cruzeiro circula pouco. Mas é o que temos. Disponha.”
(p. 81).
Respeito aos poderosos:
“Como a justiça era cara, não foram à justiça. E eu, o caminho aplainado,
invadi a
terra do Fidélis, paralítico de um braço, e a dos Gama, que pandegavam
no Recife, estudando direito. Respeitei o engenho do dr. Magalhães, juiz.” (p.
49).
Em muitos momentos é enfatizado
os aspectos ruins da sociedade, mas não de forma negativa (se é que isso seja
possível), mas um despertar para os problemas do homem.
Uma coisa os estudantes de
vestibular não podem reclamar, é a linguagem despojada em S. Bernardo, com
aproximação muitas vezes da linguagem escrita da linguagem falada.
S. Bernardo é uma propriedade
localizada no município de Viçosa, Alagoas.
O romance é escrito em 1ª pessoa (é o próprio Paulo Honório
quem narra) e abusa da metalinguagem, o que eu adoro e me lembra um pouco o
fofo do Machado de Assis, e assim é a primeira frase dele: “Antes de iniciar
este livro, imaginei construí-lo pela divisão do trabalho.” (p. 07);
Na verdade trata-se das memórias
de Paulo Honório (ele narra os fatos aos cinquenta anos de idade): “Há fatos
que não revelaria, cara a cara, a ninguém. Vou narrá-los porque a obra será
publicada com pseudônimo.” (p. 12). Adorei!!!!
O tempo da narrativa é não linear
(não é uma narrativa cronológica, mesmo porque tratam-se de memórias): “De
resto isto vai arranjado sem nenhuma ordem, como se vê” (p. 12); “Aqui existe
um salto de cinco anos, e em cinco anos o mundo dá um bando de voltas.” (p.
48). A narrativa inicia pelo fim, eis que no inicio do capítulo III, Paulo
Honório fala “Começo declarando que me chamo Paulo Honório, peso oitenta e
nove quilos e completei cinquenta anos
pelo S. Pedro.” (p. 14).
Alguns personagens e adjetivos
que eu atribui:
Madalena, a escolhida, pois “é
sisuda, econômica, sabe onde tem as ventas e pode dar uma boa mãe de família.”
(p. 102); O próprio Paulo Honório assim a descreve: “Madalena possuía um
excelente coração. Descobri nela manifestações de ternura que me sensibilizaram.
E, como sabem, não sou homem de sensibilidades. É certo que tenho experimentado
mudanças nestes dois últimos anos. Mas isto passa.” (p. 121).
Seu Ribeiro, o guarda-livros:
“[...] um velho alto, magro, curvado, amarelo, de suíças, chamado Ribeiro.” (p.
44) – adorei esse adjetivos...; “Seu Ribeiro tinha setenta anos e era infeliz,
mas havia sido moço e feliz.” (p. 44); Quando era moço, “Seu Ribeiro
enraizou-se na capital. Conheceu enfermarias de indigentes, dormiu nos bancos
dos jardins, vendeu bilhetes de loterias, tornou-se bicheiro e agente de
sociedades ratoeiras. Ao cabo de dez anos era gerente e guarda-livros da Gazeta, com cento e cinquenta mil-réis
de ordenado, e pedia dinheiro aos amigos.” (p. 46).
João Nogueira, o advogado, meio
pedante: “João Nogueira lembrou-se de que era homem de responsabilidades.
Bacharel, mais de quarenta anos, uma calvície respeitável. Às vezes metia-se em
badernas. Mas com clientes só negócios. E a mim, que lhe dava quatro contos e
oitocentos por ano para ajudar-me com leis a melhorar S. Bernardo, exibia
ideias corretas e algum pedantismo.” (p. 53)
Dr. Magalhães, aquele que quer
aplausos: “O dr. Magalhães é pequenino, tem um nariz grande, um pince-nez e por
detrás do pince-nez uns olhinhos risonhos. Os beiços, delgados, apertam-se. Só
se descolam para o dr. Magalhães falar a respeito da sua pessoa. Também quando
entra nesse assunto não para.” (p. 73).
Ainda tem o Casimiro Lopes, o
criado fiel, “corajoso, laça, rasteja, tem faro de cão e fidelidade de cão” (p.
19); Padilha, o parasita fofoqueiro; D. Glória, a sogra, “velha acanhada:
sorriso insignificante e modos de pobre” (p. 85); entre outros maravilhosos...
Baci
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